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Dádiva de sangue » partilhar a saúde com quem a perdeu

1 Outubro, 2004 0

Portugal está a um passo de cumprir o seu primeiro objectivo ao tornar-se auto-suficiente em componentes de glóbulos vermelhos. Para isso, é preciso que a dádiva continue a crescer e que as fileiras de dadores voluntários não fiquem mais magras: as 350 mil unidades de sangue por ano só serão alcançadas se mais portugueses colocarem as suas veias à disposição do próximo.

Portugal quase auto-suficiente em glóbulos vermelhos

No próximo ano, no máximo em 2006, os doentes, dentro das fronteiras lusas, poderão ser atendidos sem esperas, sem ser necessário estabelecer prioridades ou «fazer ginástica» para receber sangue alheio. Isto porque Portugal atingirá a sua primeira meta de auto-suficiência em componentes eritrocitários (glóbulos vermelhos). Ou seja, o número de dádivas de sangue vai crescer o suficiente para que todos aqueles que necessitam o recebam.

Conseguir a auto-suficiência significa alcançar o número de dádivas para satisfazer anualmente as necessidades nacionais em componentes terapêuticos de sangue. Isto está calculado, aproximadamente, em 350 mil unidades de concentrados eritrocitários, acrescentando uma reserva estratégica de mais 30 mil unidades e o aproveitamento do plasma para produção de medicamentos de si derivados.

O crescimento da dádiva tem sido tão sustentado que o Instituto Português do Sangue (IPS) se atreve a prever que, dentro em breve, também vai ser possível criar uma reserva estratégica de sangue. Estas cerca de 30 mil unidades extra vão servir para, por exemplo, fazer frente a grandes acidentes de viação ou catástrofes naturais.

Os números falam por si: em mais de uma década o País cresceu faseadamente 100 mil unidades. E os louros desta quase–conquista da auto-suficiência revertem, em grande parte, para quem estende o braço e dá o seu sangue.

O que os move?
«É uma partilha de saúde com quem a perdeu, com quem está em grande aflição e dificuldade», avança, em jeito de explicação, o Dr. Almeida Gonçalves, director do IPS.

Em Portugal, existem cerca de 600 organizações de dadores, que vão desde estruturas muito incipientes (por exemplo, um líder numa empresa, que sensibiliza os seus colegas e arranja 30 ou 40 voluntários para dar sangue num dia), até associações muito organizadas, com estatutos, bases programáticas, tudo com registos notariais, com assembleias-gerais, corpos directivos, órgãos fiscalizadores.

Mas, afinal, o que faz aumentar o número de dadores e o que leva os que já existem a manter a camisola vestida?

«Tem-se falado muito em dádiva de sangue, fizeram-se muitas campanhas a nível nacional. Isto entra pelos olhos e pelos ouvidos dos portugueses, vai amadurecendo, as pessoas vão adquirindo uma cultura de dádiva. Temos uma base cada vez maior de dádivas e dadores», argumenta Almeida Gonçalves.

Há uma outra entidade, para além do IPS, das associações e dos dadores individualizados que, em Portugal, também tem muita responsabilidade no fomento da dádiva: a Igreja Católica.

«Tem tido um papel determinante, com uma intensa e maior participação nas zonas Norte e Centro do País, onde é fortemente estimuladora da dádiva, incentivando as pessoas a fazerem-na. O apelo é, mais ou menos, qualquer coisa como: se querem ser solidários, ajudem o próximo e se puderem façam-no através da dádiva de sangue. Esta é uma mensagem muito forte dada pela Igreja Católica. É passada nas missas, nas eucaristias, nos núcleos de acção católica. E isto funciona bem», lembra o director do IPS.

Todavia, não se pense que, por estarmos quase a alcançar a auto-suficiência, as dádivas futuras são dispensáveis. Pelo contrário. O IPS, por exemplo, tem a árdua (ou talvez não) tarefa de manter as pessoas na dádiva.

«Em Portugal, é muito fácil trazer as pessoas a fazer uma dádiva. É mais difícil mantê-las a doar o seu sangue com regularidade. É aqui que é preciso continuar a trabalhar, criar, como dizia, uma cultura de dádiva. Não pode ser uma só vez ou com grande irregularidade», diz Almeida Gonçalves.

Sangue europeu
À frente do IPS há 12 anos, Almeida Gonçalves está à-vontade para dizer que muito se tem feito nesta área, não só para incrementar a dádiva de sangue dos portugueses, mas também, nos bastidores, para garantir a segurança e a qualidade desta matéria-prima.

«O sangue em Portugal é tão seguro como noutras partes do mundo. Só não podemos falar em segurança absoluta porque ela não existe em Medicina. Além de que temos sempre encostadas ao pescoço, quais espadas, as novas doenças emergentes. E os vírus também se modificam», sublinha o responsável do IPS. Em matéria de segurança e qualidade, aliás, esta entidade fez grandes avanços nos últimos anos, de forma a atingir níveis de excelência e a preparar-se para a uniformização em matéria de processamento de sangue no espaço da União Europeia (UE).

Neste momento está a ser transposto para a legislação nacional o texto da Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho 2002/98/CE, de 27 de Janeiro de 2003. O objectivo é que todo o sangue que circula e é recolhido no espaço comum seja tratado da mesma maneira, «para que toda a gente que está em trânsito ou que vive fora do seu país, na UE, tenha a mesma qualidade e a mesma segurança transfusional que tem no seu próprio país», sublinha Almeida Gonçalves, acrescentando:

«Estamos a mudar a Lei Orgânica do Instituto, que data de 1990. Vem separar os serviços centrais do IPS dos Centros Regionais de Sangue (CRS) de Lisboa, Porto e Coimbra, de maneira a criar aqui um Instituto e uns subinstitutos. Eles vão ter autonomia e responsabilização próprias, o que não acontecia rigorosamente até hoje.»

Na prática, com esta nova Lei Orgânica, os serviços centrais do IPS vão passar a ser uma Autoridade Competente, «estrutura que fiscaliza, coordena, licencia, audita e controla toda a qualidade do sangue nos CRS ou nos hospitais que ainda colhem sangue e deixarão de o fazer. É uma entidade que tem de ser independente das estruturas colhedoras para que tenha a isenção e o distanciamento necessários, a fim de que aquilo que preconiza, ou manda cumprir, possa estar independente», garante Almeida Gonçalves.

É também a Autoridade Competente que vai informar, nos comités da Comissão Europeia, da aplicação da Directiva, sobre a forma como a transposição e o cumprimento destas normas vão acontecendo em Portugal.

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