40 anos de hepatite B
A hepatite B é um dos graves problemas de saúde pública a nível mundial. Existem 350 milhões de infectados de forma crónica (portador crónico). Calcula-se que em Portugal possam existir cerca de 100.000 infectados. O portador crónico, além de poder vir a desenvolver as várias complicações da doença, serve como reservatório ambulante» do vírus, dado a probabilidade de infectar outros indivíduos.
A hepatite B é provocada por um vírus oncogénico, visto ser um dos agentes que pode originar o cancro do fígado, de elevada malignidade. A hepatite B pode ocorrer de forma aguda, aquando do primeiro contacto com o vírus, bem como de forma crónica em que este persiste no organismo, na grande maioria dos casos para sempre.
Em cerca de 5% das hepatites agudas B o indivíduo infectado torna-se «portador crónico». Alguns destes desenvolvem fenómenos inflamatórios crónicos no fígado que evoluem para hepatite crónica e cirrose hepática. Na cirrose, com o passar do tempo, o fígado pode deixar de cumprir as suas funções e surgir icterícia (olhos amarelos), ascite («barriga de água»), hemorragia digestiva («vómitos com sangue»). Outra das consequências é o cancro do fígado que surge anualmente em 4-5% dos doentes com cirrose.
A transmissão do vírus da hepatite B ocorre principalmente por duas vias: sangue e sexual. Em países de risco mais elevado (Ásia) a principal via é a contaminação no momento do parto quando a mãe está infectada e a nível familiar. No mundo ocidental é a via sexual.
A caracterização do vírus e a descoberta da vacina e do tratamento da hepatite B constituem um dos exemplos da evolução da ciência moderna. Com efeito, esta história de sucesso para a Medicina e para a humanidade começou há 40 anos, com a identificação de um elemento do vírus (antigénio Austrália), em 1965. O actor principal desta descoberta foi o médico norte-americano Baruch Blumberg, que viria a merecer o Nobel da Medicina, em 1976.
Em 1980 inicia-se a utilização da vacina da hepatite B. É a primeira vacina anticancro e duplamente antivírica, já que evita ainda a hepatite delta. A vacinação de todos os recém-nascidos e dos adolescentes em mais de 100 países, permitiu a redução drástica da hepatite aguda B, do número de portadores crónicos e do cancro do fígado associado à hepatite B.
Para aqueles em que não foi possível a utilização da vacina em tempo útil e que surgem com as consequências da hepatite B existe esperança no tratamento antivírico. Desde 1985 que existem fármacos que interferem com a actividade do vírus: um de forma injectável, o interferão peguilado, com uma administração semanal e outros por via oral, a lamivudina e o adefovir. Ainda que a hepatite B se complique de cirrose ou cancro a esperança deve manter-se dado a possibilidade de recorrer ao transplante hepático, disponível em Portugal desde há quase 15 anos, com resultados muito satisfatórios para a grande maioria dos doentes.
Apesar destes 40 anos de avanços médicos, a hepatite B ainda é fonte potencial de muito sofrimento, devendo a informação da população e a promoção da vacinação em todos os recém-nascidos e adolescentes, um dos objectivos principais da sua prevenção.