Arquivo de Psiquiatria - Médicos de Portugal

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Todas as espécies animais sentem medo. Esta é mesmo uma condição indispensável para proteger o indivíduo do perigo. Quando o perigo está iminente é natural que o indivíduo seja invadido por uma sensação desconfortável que o impele a preservar a sua integridade física.


Apesar da ausência objectiva de perigo, o indivíduo sente uma aflição incontrolável e procura a todo o custo afastar-se da causa dessa ansiedade sem limites. Está-se então perante uma fobia, que herdou o nome da deusa grega do medo - Phobos.


O medo persiste e é desencadeado sempre que a pessoa está perante o objecto ou a situação temida. De tal forma que a simples hipótese de isso acontecer é, por si só, motivo de ansiedade, com repercussões graves no quotidiano e na qualidade de vida. A pessoa reconhece que o seu medo é irracional mas não consegue controlá-lo.


Ritmo cardíaco acelerado, disfunções gástricas, náuseas, diarreia, micção muito frequente, sensação de sufoco, rubor na face, transpiração abundante, tremores e desmaios são as manifestações fisiológicas da fobia. A depressão é, frequentemente, um desfecho destes quadros de fobia e ansiedade, às quais andam igualmente associados o abuso de álcool e drogas.


Não se sabe ao certo quantas pessoas sofrerão de fobia, mas estima-se que dez por cento da população seja afectada. Alguns estudos estabelecem uma margem maior, definindo entre três e dez em cada 100 pessoas o número que sofre de uma qualquer fobia. O que se sabe é que as mulheres são mais predispostas, mas não foi ainda encontrada uma explicação para esta tendência. Há uma excepção: a fobia social, sobre a qual se falará um pouco mais à frente, atinge igualmente homens e mulheres.


Sabe-se também que, em geral, é na infância e na adolescência que surgem os primeiros sinais da fobia, que se prolonga pela idade adulta quando não é tratada convenientemente.


 


Medo de tudo e de todos


Os transtornos fóbico-ansiosos constituem um grupo de doenças mentais em que a ansiedade é associada a um objecto ou situação. Com base nesta definição foram estabelecidos três tipos principais de fobias: fobia social, fobia específica e agorafobia, talvez a mais conhecida.


A fobia social traduz-se pelo medo de se expor a outras pessoas que se encontrem em grupos pequenos, podendo manifestar-se, por exemplo, em festas, reuniões, restaurantes.


Muitas vezes são restritas a uma única situação, como comer ou falar em público, assinar um cheque na presença de outras pessoas ou encontrar-se com alguém do sexo oposto. A mera possibilidade de estar a ser observado é geradora de ansiedade - o sangue sobe ao rosto, as náuseas e os tremores sucedem-se.


Associada a este tipo de fobia anda, geralmente, um quadro de baixa auto-estima e receio de críticas, o receio de ser julgado negativamente.


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O Inverno está associado ao frio e os seus dias sombrios não abonam muito ao despertar de sensações positivas. Para muitas pessoas, é mesmo sinónimo de mal-estar que extravasa para uma forma patológica. A depressão sazonal é bem real e tende a desaparecer assim que raiam os tons primaveris, bem mais iluminados.


Afinal, a ausência de luz é a grande responsável pela depressão sazonal. Do mesmo modo que o tempo varia com as estações do ano, o ritmo circadiano dos indivíduos propensos a este tipo de depressão ressente-se. Um dos primeiros sinais de alerta são as alterações no padrão de sono (dormir demais ou ter dificuldade em dormir).


Mesmo dormindo mais horas, não significa descansar, na medida em que o sono, que se quer reparador, é agitado, impedindo o despertar revigorante para um novo dia. A verdade é que o despertador pode tocar, mas a vontade de sair dos cobertores é escassa, muito escassa.


Acordando cansado, o indivíduo resiste a levantar-se e quando o faz tende a levar a sonolência ao longo do dia, além de uma irritabilidade frequente. Os contratempos do quotidiano, por mínimos que se afigurem, assumem então importância exagerada, desencadeando stresse, angústia e uma sensação de vazio.


 


Equador amigo


As pessoas que sofrem de depressão sazonal não têm um perfil típico. Esta não escolhe sexo nem idade, nem sequer discrimina ocupações profissionais ou grupos socio-económicos. Mas as crianças também podem ser afectadas.


Uma das conclusões mais sólidas é a correlação positiva da doença com a distância do Equador, por causa do tempo de luz. À medida que a órbita do Sol se torna mais baixa e as horas do dia mais curtas, maior é a incidência da depressão sazonal.


Os investigadores associam as mudanças bioquímicas inerentes à depressão sazonal com a exposição à luz forte.


A melatonina - hormona que regula o sono - é segregada no escuro, enquanto a serotonina, neurotransmissor que regula o humor, a energia e o apetite, atinge o pico quando a pessoa é exposta à luz brilhante.


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Quando as temperaturas começam a baixar e o dia escurece mais cedo, é natural que haja uma maior tendência para ficar em casa, uma espécie de preguiça que convida a comer mais e dormir mais. É uma reacção normal e, provavelmente, já toda a gente a sentiu.


Mas há pessoas que reagem de uma forma mais radical à alternância das estações, com a chegada do Inverno a dar lugar a uma letargia e fadiga sem precedentes, a alterações do humor (para pior, claro), a sentimentos e comportamentos depressivos.


São pessoas que sofrem de depressão sazonal, também designada como desordem afectiva sazonal. Trata-se de uma condição cíclica, o que significa que os sintomas regressam assim no Outono e desaparecem com os dias quentes e solarengos do Verão.


E tudo porque as noites são mais longas e os dias mais curtos e cinzentos: o que está em causa é mesmo o menor número de horas de luz e a qualidade da mesma. A luminosidade é menor em todo os sentidos, o que se revela determinante para as pessoas que sofrem de depressão sazonal.


A luz influencia o nosso relógio biológico, interferindo nos ciclos de vigília e sono mas também no humor. Tudo indica que a baixa luminosidade causa uma quebra na produção de serotonina, um químico natural do cérebro que afecta o humor: quanto menos serotonina, maior a tendência para a tristeza e a depressão; pelo contrário, níveis acrescidos deste neurotransmissor aumentam o estado de satisfação - é por isso que é chamada a hormona da felicidade.


Por outro lado, a luz também tem influência sobre a melatonina, uma hormona associada ao sono e que é produzida durante a noite: ora, durante o Inverno, as noites são maiores do que os dias, o que faz disparar os níveis de melatonina e, com eles, a sensação de fadiga e de falta de energia.


A fadiga é permanente, mesmo se se dormem mais horas durante a noite: o sono não cumpre o seu papel retemperador, acorda-se cansaço e passa-se o dia num estado generalizado de sonolência. Também o apetite sofre alterações, sendo frequentes os desejos vorazes por hidratos de carbono, em particular açúcares, o que acaba por conduzir a ganhos de peso.


A perda de energia é comum, acompanhada de dificuldades de concentração e processamento da informação. A ansiedade e a tristeza dominam, com progressiva perda de interesse pelas actividades que outrora davam prazer e com tendência para o isolamento.


Não se conhecem as causas da depressão sazonal, mas o conhecimento dos mecanismos da influência da luz sobre a melatonina e a serotonina permite concluir que a depressão sazonal é mais um processo biológico do que psicológico ou psiquiátrico. Esta teoria é confirmada pelo facto de ser mais frequente à medida que aumenta a latitude, ou seja, nos povos que vivem mais distantes do Equador e, portanto, com menos horas de luz por dia.


A idade também parece desempenhar o seu papel, na medida em que este é um problema mais comum a partir dos 25 anos, sendo muito raro abaixo dos 20. É também mais frequente entre o sexo feminino, embora no masculino os sintomas possam ser mais acentuados.


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A doença bipolar na criança surge, normalmente, após a puberdade, após os 11 ou 12 anos, embora haja registos de casos pré-púberes. Segundo alguns estudos, a doença bipolar tem uma componente genética, pelo que "as crianças com parentes de primeiro grau são potenciais candidatos ao desenvolvimento da doença". Estes jovens manifestam alterações de humor, que varia entre a mania (elação do humor) e a depressão.


"O diagnóstico na criança é dificultado pela duração e variação dos episódios, já que, regra geral, não duram os sete dias que são necessário para se determinar um episódio de mania", explica a Dr.ª Paula Correia, pedopsiquiatra do Centro Hospital da Cova da Beira, na Covilhã.


Como a criança pequena não consegue transmitir através da linguagem verbal o que está a acontecer dentro de si, "é difícil para os outros (família e grupo de pares) entenderem o que se está a passar". E isto decorre do facto de haver uma "inconstância do humor", que alterna entre a euforia e a tristeza. Uma criança que sofre de uma doença bipolar pode, inclusive, manifestar sentimentos "megalómanos" face à realidade envolvente num momento, mas, passado algum tempo, sentir-se inferiorizada.


Na maioria dos casos a hiperactividade é um sinal muito frequente. Mas, segundo a pedopsiquiatra, têm de estar presentes outros sintomas como: "a grandiosidade, a fuga de ideias, a elação do humor". Com base nestes elementos consegue-se traçar um diagnóstico "preciso e longitudinal", que é efectuado ao longo do tempo. "É necessário ter em atenção a mudança de comportamento da criança e as alterações no estado mental", esclarece.


Já na adolescência, embora os sintomas sejam semelhantes aos da criança, com a diferença que têm um prolongamento maior no tempo, "há, ainda, o risco de tentativa de suicídio". Para evitar estas situações, para além da terapêutica farmacológica, que consiste na prescrição de estabilizadores de humor, "tem de haver um apoio psicológico dos jovens e da família".


 


Lidar com a doença


Para a especialista, a família é um ponto de suporte do doente bipolar. "Tem de haver uma retaguarda e uma capacidade de os elementos familiares se unirem", fundamenta a pedopsiquiatra. Embora não "haja fórmulas mágicas" para se agir com uma criança bipolar, "os progenitores devem entender as dimensões da doença".


Esta patologia, em certos casos, pode interferir com o rendimento escolar. Mas, de acordo com Paula Correia, tudo depende da "instabilidade emocional e dos períodos livres de doença". Contudo, cada caso é um caso e não há duas crianças iguais, mesmo aquelas que sofrem de uma doença bipolar.


Se houver períodos isentos de crises, a escola e os colegas podem nem se aperceber de que existe um problema". Apesar das variações de humor, em casos extremos de degradação do estado de saúde, como existência de psicose (delírios ou alucinações como ouvir vozes, ver pessoas que não existem) ou risco suicida, equaciona-se a hipótese de internamento hospitalar.


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Portugal é dos países da Europa o que tem das maiores taxas de prevalência de doenças mentais. "No último e único estudo epidemiológico efectuado em Portugal da responsabilidade do ex-coordenador da Saúde Mental, Prof. Doutor Caldas de Almeida, e do qual apenas temos acesso a alguns dados fornecidos pelo mesmo aquando de uma conferência de imprensa e de algumas apresentações avulso em reuniões científicas, ficamos a saber que a prevalência de doenças mentais em Portugal era de cerca de 22,9%.

Muito próxima da dos EUA, das mais altas do Mundo, 26,4%", refere ao Jornal do Centro de Saúde, o Dr. Medeiros Paiva, psiquiatra e é vogal Norte na Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental. As perturbações psiquiátricas mais frequentes na população portuguesa são as perturbações de ansiedade (16,5 por cento) e a depressão (7,9), segundo os primeiros resultados desse estudo.



O que fazer?


Nas consultas do psiquiatra, as queixas mais frequentes são: "sensação de angústia, medo indefinido, medo do futuro, tristeza e dores, dores generalizadas, sem explicação, não compreensíveis (que levam frequentemente a consultas médicas em excesso com pedido de análises e exames radiológicos desnecessários) ".

A Organização Mundial de Saúde considera, no que diz respeito especificamente à depressão, que esta doença será, em 2020, a segunda causa de incapacidade no mundo (mesmo, no considerado terceiro mundo) e prevê que passados mais 10 anos, em 2030, ultrapassará no ranking das doenças, as cardiovasculares, passando para primeiro lugar.

"Há que fazer algo muito rapidamente. Não compete, porém, à Medicina o principal papel de estancar este contínuo aumento da prevalência das depressões quando a principal causa assenta num estilo de vida e numa hierarquia de valores que aniquila o lado humano do animal com o cérebro mais desenvolvido de todos (cem mil milhões de neurónios - a sua célula principal) ", adianta Medeiros Paiva.

Para o psiquiatra, é essencial "obrigar os partidos a governar em nome de valores e não de mercados para que a prevalência das doentes mentais deixem de subir. Queixarem-se do aumento exponencial do uso de antidepressivos, salientando apenas o lado economicista, é de uma menoridade intelectual e de uma ignorância confrangedora. Os mecanismos geradores do mal-estar da civilização são reconhecíveis por quem estiver atento à realidade e não seguir acriticamente os paladinos do mercado e do neoliberalismo selvagem", critica.


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Em Portugal as patologias do sono estão a aumentar, o que, segundo a neurologista Lívia de Sousa, deriva do estilo de vida atual. “Nas sociedades Ocidentais há uma cultura do estar “on” principalmente pela conciliação da profissão com os afazeres familiares. Nas consultas de enxaquecas uma queixa frequente dos doentes é a de não terem tempo para dormir, o que acaba por contribuir para que esta patologia se torne crónica. Além disso existe uma comorbilidade entre a enxaqueca (tipo de dor de cabeça) e a depressão. A depressão também pode acompanhar-se de insónia ou mais raramente hipersónia (sonolência excessiva)”.


Além de estarem relacionadas, depressão e enxaquecas são patologias que se escrevem no feminino e afetam sobretudo as mulheres. Lívia de Sousa refere que “na prática clínica vemos mais frequentemente mulheres deprimidas e com enxaquecas do que homens. No entanto, quando são os homens os doentes a situação é, em geral, mais difícil de resolver. Provavelmente há fatores hormonais que influenciam as enxaquecas. Esta é mais frequente após a puberdade nas mulheres, as crises são mais intensas na altura do período menstrual, a enxaqueca em geral melhora na gravidez e, pelo menos um terço, na menopausa”.


Relativamente à relação entre o sono e os quadros depressivos, Carlos Gois, psiquiatra, afirma que “hoje em dia considera-se que existe uma associação bidirecional entre as perturbações afetivas e a insónia mantida, ou seja, a ansiedade e a depressão aumentam o risco de incidência de insónia, sendo o reverso também verdadeiro, o dormir pouco aumenta o risco de ansiedade e depressão”.
O especialista refere que o facto de dormirmos cada vez menos e pior acaba por refletir-se também em sintomas como “sonolência diurna ou hiperatividade, irritabilidade e ansiedade consoante a suscetibilidade pessoal. Pode também ocorrer alteração da memória e de concentração nas tarefas diárias. Um maior absentismo ou propensão para acidentes pode derivar destas alterações”.


No entanto, o aumento do diagnóstico de depressões em Portugal não é só explicado pelo facto de dormirmos mal. “A perturbação dos ritmos circadianos (ciclo biológico do sono) e a sua dessincronização sistemática está provavelmente relacionada com o aumento do risco de aparecimento de depressão, mas é um fator a acrescentar a tantos outros candidatos, como a alimentação não saudável, a desigualdade e o isolamento sociais”, explica Carlos Góis.


Para dormir melhor, os dois especialistas aconselham a manutenção de um horário do sono regular, aproximar o tempo na cama ao período de sono efetivo, praticar exercício físico, alimentar-se de forma saudável, evitando a ingestão de cafeína e álcool à noite. Em geral, importa que os ritmos cronobiológicos, ou seja, os ritmos circadianos sejam semelhantes diariamente e de acordo com a necessidade de cada pessoa. 





A depressão é uma das doenças psiquiátricas mais comuns na nossa sociedade, sendo que cerca de 20% dos portugueses sofrem desta patologia(1). Com o objetivo de alertar e esclarecer para os diversos tipos de depressão e salientar que esta doença tem tratamento, a Lilly apresenta a campanha «Saia do Escuro. A depressão tem tratamento».


Esta ação vai arrancar com um paint mob, a 1 de Outubro, que decorrerá em simultâneo em várias cidades nacionais:


Lisboa, Via Recíproca (Parque das Nações) – 11h00
Matosinhos, Jardim Basílio Teles – 15h00
Faro, Jardim Manuel Bivar – 10h00
Évora, Jardim Público de Évora – 11h00
Coimbra, Parque Verde do Mondego – 10h00


Dar cor ao cenário negro da depressão é o mote desta incitativa que vai juntar várias pessoas para colorir um muro onde estarão inscritos alguns sintomas da depressão.


Manifestando-se de forma diferente de pessoa para pessoa, a depressão não escolhe idade nem sexo, apresentando-se em várias dimensões ao nível dos sintomas emocionais, físicos e físicos dolorosos. Tristeza, desinteresse, falta de apetite, cansaço, falta de energia, insónia ou dores musculares e de costas, são alguns dos sintomas da depressão que não devem ser desvalorizados.


António Palha, presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental (SPPSM), revela que «a depressão é um flagelo que atinge cada vez mais portugueses como mostrou o estudo epidemiológico apresentado há dois anos onde se salienta a alta prevalência da depressão. A campanha «Saia do escuro. A depressão tem tratamento» dentro da perspetiva psicoeducativa, pode ajudar aqueles que sofrem de depressão a perceberem que esta é uma doença tratável e que se os doentes forem bem acompanhados podem ter de fato uma melhor qualidade de vida.»


Neste sentido, o presidente da SPPSM diz que «este tipo de campanhas são de grande importância já que ajudam os doentes e as suas famílias a perceberem melhor o que é a depressão e como lidar com esta patologia, fazendo-os sentir que podem estar apoiados na doença. Por outro lado, é igualmente necessário, nos dias de hoje, a divulgação e identificação dos sintomas e, também, o respetivo tratamento.»


João Relvas, presidente da Associação Portuguesa de Psiquiatria Biológica, explica que a compreensão da depressão passa pelo entendimento da interação de diferentes fatores biológicos, psicológicos, culturais e sociais e dos seus efeitos recíprocos. «De uma maneira geral o grande público desconhece estes aspetos estando muitas vezes a depressão associada a "fraqueza de carácter", falta de "força de vontade" e outros mitos que tendem a promover falsos conceitos e uma visão estereotipada que favorece a estigmatização da doença psiquiátrica em geral e da depressão em particular.»


Por outro lado, o médico destaca também que é importante dar a conhecer as diversas possibilidades de tratamento, mostrando que a remissão é possível. «O tratamento deve ser feito depois de uma avaliação clínica correta. A terapêutica pode ter várias vertentes, das quais as principais são as medicações psicofarmacológicas e as psicoterapias, em particular a psicoterapia cognitivo-comportamental. Atualmente, a ênfase do tratamento é colocada na remissão e recuperação do episódio depressivo atual e na prevenção das recaídas e recorrências futuras. Os antidepressivos têm um papel importante nesta estratégia terapêutica, devido aos seus menores efeitos secundários e a uma maior aceitação e adesão por parte dos doentes.»


No idoso a depressão é também uma realidade, estando muitas vezes associada a casos de suicídio. Lia Fernandes, presidente da Associação Portuguesa de Gerontopsiquiatria, confirma que «a depressão é ainda o problema de saúde mental, mais frequentemente ligado ao suicídio na idade avançada. Contudo, nem todos os idosos que se suicidam estão deprimidos, e nem todos os deprimidos se suicidam. Apesar disto, detetar precocemente e tratar a depressão ajuda a reduzir o risco individual de suicídio. De facto, entre as causas mais frequentes de suicídio nos idosos em Portugal, destacam-se sobretudo as doenças físicas, institucionalização, viuvez, baixo suporte social e doenças psiquiátricas (depressão e alcoolismo). Só assim se compreende que o suicídio seja atualmente uma realidade em crescimento, nos mais velhos (correspondendo a ¼ do total de suicídios do país).»


Para Delfim Oliveira, presidente da Associação de Apoio aos Doente Depressivos e Bipolares (ADEB), «a doença depressiva pode ter graves consequências na qualidade de vida da pessoa, particularmente nos casos em que não é tratada adequadamente. Assim, ações como a campanha «Saia do escuro. A depressão tem tratamento» têm a capacidade de sensibilizar a população para a gravidade que a depressão tem no quotidiano dos doentes e, ao ser percebida como doença, criar maior recetividade para os tratamentos, por serem eficazes e melhor tolerados, que possibilitam mais ganhos de saúde e consequentemente maior qualidade de vida.»


Na opinião de Filipa Palha, presidente da Encontrar-se, o negativismo associado à depressão é um dos principais problemas relacionados com a área da saúde mental. Neste sentido é fundamental ter uma atitude positiva de procurar ajuda e encarar a doença com normalidade: «o estigma associado à doença mental ainda é um dos maiores obstáculos à promoção da saúde mental. Desta forma é fundamental combater todos os preconceitos e negativismo associados a problemas mentais e encará-los como qualquer outro tipo de problema de saúde. Aceitando sem vergonha, procurando ajuda e tratamento. Infelizmente, os doentes depressivos ainda têm receio de serem rejeitados, rotulados, discriminados, não respeitados. Poucas pessoas têm a coragem de partilhar as suas experiências, de demonstrar que não perderam a sua identidade e que, apesar de tudo, continuam o seu percurso de vida dentro da normalidade.»


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Clinicamente fala-se de depressão quando o humor está muito abatido (a tristeza é profunda) ou há ane-donia (incapacidade para o prazer) e quando tudo isso, estando presentes outros sintomas, leva a marcado sofrimento e a limitações do funcionamento social ou da sobrevivência.


Como se imagina, as fronteiras entre tristeza ou infelicidade normal, estados de humor deprimido ligeiro (por vezes reactivo a problemas) e depressão grave são frequentemente difíceis de definir. No entanto, a diferença entre estes estados é enorme.


A depressão, que nem sempre é evidente mesmo quando grave, pode ser devastadora nas suas consequências e não raramente acaba no suicídio. Deve, por isso, ser activamente procurada pelos clínicos e tratada com todos os cuidados e recursos.


Por outro lado, a tristeza e alguns estados de humor depressivo menos graves podem constituir-se como reacções adequadas a problemas pessoais, a stress no trabalho ou mesmo como reacções ao sistema de organização social.


O elevadíssimo aumento das perturbações depressivas diagnosticadas nos últimos 50 anos, segundo dados epidemiológicos da Organização Mundial de Saúde, e o concomitante acréscimo no consumo de consultas e de medicamentos antidepressivos reflecte, provavelmente, o aumento do reconhecimento ou da prevalência de estados depressivos ligeiros e de sentimentos de tristeza/mal estar que, entretanto, foram sendo medicalizados - a "medicalização da infelicidade".


Sabe-se que os tratamentos psiquiátricos, sejam eles quais forem, são mais eficazes nas depressões severas do que nas ligeiras.


Ora se a tristeza e as "depressões ligeiras" podem até ser úteis na criação de respostas alternativas e beneficiam pouco com os tratamentos, valerá a pena diagnosticá-las e tratá-las?


Muitos julgam que não, até porque esses "tratamentos" não estão desprovidos de potenciais inconvenientes tanto a curto como a longo prazo. Suspeita-se que a utilização indiscriminada de medicamentos antidepressivos possa favorecer a recorrência de estados depressivos e de outras perturbações do humor cíclicas. Não se sabe se a própria criatividade pode ser negativamente afectada nesses casos.


A obsessão com o crescimento económico e a fé cega na cultura do trabalho parecem não estar a dar bons frutos em ter-mos de saúde mental das pessoas e de saúde física do plane-ta. Claro que no sistema vigente as dificuldades de uns são sempre oportunidades de negócios para outros e até de eventual descida do défice das contas públicas.


E o bem-estar, a harmonia com o mundo, a ética, a estética e a racionalidade?


Pode ser que venham a ser conquistados pelos descontentes e tristes num futuro em que o tempo para pensar e fruir seja retirado ao tempo para produzir e poluir; em que o desenvolvimento ameaçador para a vida na Terra seja desencorajado como o uso do tabaco; em que muitos dos gestores e economistas de hoje sejam substituídos por cientistas, filósofos e poetas; em que a China mude antes de implodir; e em que os Invernos da alma sejam vistos como prelúdios necessários às Primaveras.



Dr. Luís Ferreira,
psiquiatra e director de Serviço do Hospital Magalhães Lemos





O conhecimento da doença bipolar é ainda escasso, nomeadamente quanto às suas origens. Sabe-se que esta perturbação do humor está relacionada com a hereditariedade, na medida em que mais de dois terços dos doentes têm antecedentes familiares. O que está por identificar são os genes que justificam esta predisposição.


Também os neurotransmissores parecem estar envolvidos, tendo sido identificadas alterações nestes doentes face a pessoas saudáveis. Aliás, os investigadores tendem a relacionar os dois factores, inclinando-se para a hipótese de a causa da doença bipolar estar nos genes que regulam os neurotransmissores.


O que se sabe também é que o consumo de álcool e substâncias psicotrópicas potencia os episódios maníaco-depressivos. Outra hipótese em estudo prende-se com o fenómeno da sensibilização, com os primeiros episódios da doença a serem desencadeados por acontecimentos traumatizantes, após o que cada nova crise induz alterações a nível do cérebro, até que as oscilações de humor passam a ser espontâneas.


Entre a "loucura" e a arte são frequentemente estabelecidas linhas paralelas. De quando em vez organizam-se colóquios e simpósios para discutir esta relação estranha entre a doença mental e a criatividade. Nessas discussões é comum falar-se da doença bipolar. Os compositores Schumann e Tchaikovsky eram bipolares. O músico Kurt Cobain também. Peter Gabriel e Axl Rose igualmente. Vitor Hugo, autor de Os Miseráveis, sofria crises de mania e depressão, o mesmo sucedendo com Hemingway. Van Gogh pintava sob a influência da doença. O realizador Francis Ford Coppola é outro artista que lhe conhece os sintomas. Na cultura portuguesa, sabe-se que a doença bipolar afectou autores como Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro e Florbela Espanca. O que não se sabe é em que medida lhes estimulou a criatividade...


Entre uma crise de mania e uma crise de depressão, o doente vive períodos de estabilidade, sendo que cada crise pode prolongar-se por dias. Calcula-se que a doença bipolar afecte um por cento da população, o que corresponde a cerca de 100 mil portugueses em idade adulta.


Homens e mulheres apresentam a mesma probabilidade de a desenvolver, com os primeiros sintomas a evidenciar-se quase sempre na adolescência, podendo passar-se muitos anos sem que a doença seja efectivamente diagnosticada e tratada.


Os doentes bipolares vivem intercalando as crises com períodos de estabilidade, que podem durar apenas dias ou prolongar-se por meses e até anos.


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No simpósio sobre "Disfunção Eréctil: algumas intervenções terapêuticas de análise" Ana Carvalheira, presidente da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica, apresentou um estudo onde surgiram algumas conclusões importantes para a análise da evolução da disfunção eréctil, um problema muitas vezes silenciado pelo doente e familiares e para o qual os avanços terapêuticos são escassos.


Aqui discutiram-se as razões pelas quais os homens abandonam a terapia cognitiva-comportamental, verificando-se que 48,9% dos homens fazem-no devido à não eficácia dos medicamentos (40%). Num questionário anónimo a 327 participantes, 87% com relações de compromisso e 42% com estudos superiores, verificou-se que o abandono prende-se igualmente com factores relacionais e psicológicos.


Na mesma sessão, debateu-se o conceito de "mindfulness" pela sexóloga da universidade de Coimbra, Sandra Vilarinho, no âmbito da disfunção eréctil. Esta prática meditativa, que leva a pessoa a ver o pensamento enquanto um acontecimento mental isolado, sem julgamento, poderá levar a um aumento da auto-consciência e funcionamento sexual e, por conseguinte, a uma sexualidade mais satisfatória


Na sessão dedicada ao tema da "Eutanásia - suicídio assistido: sim ou não?", a Prof. Dra. Laura Santos, da Universidade do Minho, defendeu que as decisões dos doentes terminais são importantes e devem ser consideradas importantes. "Não há lugar para a imposição pela força de uma qualquer moral", ressalvou, salientando que estar vivo é muito diferente de ter uma vida.


Por seu turno, o Prof. Manuel Curado, docente da Universidade do Minho, defende que não existe lugar para qualquer forma de eutanásia ou suicídio assistido, referindo que "a dor não mata, as ideias e os valores sim".


A encerrar a manhã de hoje, a sessão "Psiquiatria Ciência vs Psiquiatria Arte", onde se chegou à conclusão de que não há um antagonismo entre os dois conceitos, mas uma complementaridade. A eficácia do tratamento psiquiátrico prende-se essencialmente com a evolução dos psicofármacos e das psicoterapias e com a existência de uma medicina aprendida "ombro a ombro", na relação interpessoal com o doente, defendeu o Dr. Pio Abreu, psiquiatra do Hospital de Coimbra.


Cerca de 900 pessoas passaram pelo VII Congresso Nacional de Psiquiatria e Saúde Mental, que reuniu, em Coimbra, vários especialistas da área das neurociências que durante três dias debateram temas como: a qualidade e inovação no sistema de saúde e nas terapêuticas, novas formas de intervenção na psiquiatria e promoção da saúde mental, foram os temas transversais a este congresso que pretendeu dar uma visão alargada do trabalho que tem vindo a ser feito no campo das ciências cognitivas.


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